Quebra de safra e preços baixos preocupa sojicultores, que não sabem como serão os rendimentos no campo e no bolso

Produtores que mal sabem se terão lucro na atual safra de soja também foram à Show Rural Coopavel. A busca era por novidades que pudessem reduzir custos ou agregar produtividade nos próximos ciclos — e quem sabe assim vislumbrar um horizonte mais favorável à frente. Mas muitos ainda se mostram reticentes em fechar negócios, o que dificulta o planejamento da indústria de insumos.

A agricultora Fernanda Gobeti, de Cornélio Procópio, no Paraná, conta que chegou a chover durante alguns dias após o plantio, mas não tardou para a chegada de uma forte estiagem. No pior momento, os 250 hectares plantados com soja ficaram 40 dias sem chuvas. Desde então, as precipitações não se regularizaram o suficiente para reverter o quadro de déficit hídrico. 

Segundo ela, os investimentos realizados nesta safra miravam uma produtividade média de aproximadamente 58 sacas por hectare. Agora, no entanto, os agrônomos que acompanham a fazenda dizem que se a colheita render metade desse volume já será bastante coisa. “Apesar do preço ter caído, a gente achava que pelo menos conseguiria pagar as contas. Mas com isso, nem a conta a gente vai conseguir pagar”, lamenta a produtora rural.

Lavoura da agricultora Fernanda Gobeti, de Cornélio Procópio (PR), enfrenta estiagem — Foto: Arquivo pessoal

A mãe de Fernanda, Selina Gobeti, produzia grãos junto com o marido há 50 anos. Para ela, o comportamento e os estragos do El Niño nesta temporada foram muito piores do que se poderia imaginar. O fenômeno de aquecimento das águas do oceano Pacífico Equatorial é um dos principais problemas enfrentados pelo agricultor nesta temporada. 

No Paraná, o Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria de Agricultura do Estado, projeta uma safra de soja da ordem de 19,2 milhões de toneladas, um recuo de 14% no comparativo com o ciclo anterior. No caso do milho de primeira safra, a colheita será 31% inferior, prevista em 2,6 milhões de toneladas.

Mas a perda de uma parte considerável da safra não é a única responsável pela crise que se abateu sobre o setor: o derretimento dos preços das commodities agrícolas — causado por perspectivas de uma ampla oferta da Argentina — também torna o cenário bastante delicado no campo. 

O Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, indica que a saca de soja está sendo negociada, em média, a R$ 112 no Paraná. No dia 11 de setembro do ano passado, quando se abriu a janela de plantio, as cotações estavam ao redor de R$ 140 por saca. Um ano atrás, os negócios aconteciam a R$ 166 por saca. 

O forte recuo assustou o pequeno produtor Mateus Santos, de Catanduvas (PR). Ele, que começou na atividade em 2018, não sabe como vai cobrir os gastos com a lavoura, mesmo com um rendimento de 83 sacas em média nos 12 hectares. 

Santos está avaliando se valerá a pena plantar milho para silagem, já que os preços do cereal estão baixos e o setor leiteiro, consumidor do produto, também está passando por uma grave crise que impossibilita reajustes de custos. 

Questionado sobre a presença na feira, o agricultor explica que como é novo no negócio, ele ainda está procurando opções de máquinas e equipamentos que estão faltando. “Mas com um pé no freio”, garante.

André Savino, da Syngenta, acredita que a tempestade deve se acalmar nos próximos meses — Foto: Divulgação

Indústrias são afetadas

Com outros agricultores também reduzindo a marcha, a indústria de insumos agrícolas também está sendo afetada. Nos corredores da Show Rural Coopavel, o que se fala é que decisões de compra para o ciclo 2024/25 estão sendo postergadas até que haja mais clareza em relação ao rendimento da safra atual. 

“Pouca coisa foi negociada; na verdade, eu diria que quase nada. Os produtores estão aguardando o fim da colheita para visualizar melhor as perspectivas para a próxima safra”, afirma Hugo Borsari, diretor de marketing da divisão de soluções para agricultura da Basf. 

O executivo explica que, neste momento do ano, as vendas do mercado de defensivos para a safra de milho estariam próximas de 80% do total. No entanto, estão pouco acima dos 50%. Repercute, além de tudo, o fato de que a área plantada na safrinha pode cair, devido à perda de janela produtiva, outra consequência do mau tempo. 

Assim como em anos anteriores, as compras devem ser fechadas mais próximas à data de início de plantio, o que levanta preocupações sobre a capacidade da indústria e da cadeia logística de entregar os produtos a tempo nas fazendas. “Considerando o cenário que já aconteceu em 2023, estaremos preparados para entregar quando o produtor precisar”, diz.

André Savino assumiu a cadeira de presidente da divisão de proteção de cultivos da multinacional Syngenta no começo do ano, já em meio à turbulência do setor. Pela sua experiência no setor de insumos e também como produtor rural, acredita que a tempestade deve se acalmar nos próximos meses e o setor poderá entrar em um novo ciclo positivo em 2025. 

Segundo ele, com juros caindo ao longo dos próximos meses, os investimentos voltarão a acontecer em larga escala. Além disso, a demanda por alimentos segue aumentando. “Há também elementos na agricultura muito interessantes, como as usinas de etanol de milho que estão sendo construídas”, afirma.

O presidente da Syngenta não ignora o momento de cautela dos lados dos produtos, nem como isso afeta a indústria, mas aposta num quadro mais favorável à frente. “Gosto de olhar uma fotografia mais ampla. Ganhar esse jogo não será fácil, claro, mas vamos definir no campo”, afirma.

Fonte: Globo Rural

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